24 de junho de 2016

A linha tênue entre a Exceção e o livro de Eliane Brum


Mesmo que A vida que ninguém vê, da escritora Eliane Brum, seja leitura obrigatória para os estudantes de Jornalismo ou para qualquer pessoa interessada na realidade cotidiana, principalmente dos seres humanos, acredito que muitos ainda possam não ter lido. Pelo simples fato de que são muuitas as leituras obrigatórias ou pelo simples fato de não terem conhecimento. Mas como está nas referências básicas da disciplina de Jornalismo de Exceção e acredito que é de grande importância resolvi compartilhar, aqui, minhas impressões sobre a obra. O livro nos leva à uma extensa reflexão e propõe o desafio de ampliar o olhar para a vida que nos rodeia. Pois olhar não basta, é preciso perceber e sentir.

Lembro-me de ter lido algumas das reportagens literárias da série A vida que ninguém vê nas edições impressas, sempre aos sábados, da Zero Hora, jornal o qual a editora trabalhou por 11 anos. Eliane é extremamente sensível e o que ela revela nesta obra nada mais é do que a verdadeira realidade de algumas almas esquecidas ou, até mesmo, nem vistas. Parece que estou falando da Revista Exceção, certo?
No livro, Eliane procura contar histórias de vidas diferentes dentro de uma mesma sociedade. Pessoas simples, como o personagem Adail; o carregador de malas do aeroporto que nunca havia voado, mas que a partir da publicação na Zero Hora e, também, com a ajuda da TAM viagens, conseguiu realizar seu sonho. Na coragem de Camila. Na fibra de David Dubin. Do Geppe Coppini, o mendigo de Anta Gorda que nunca pediu nada para as pessoas que por lá circulavam.
Outro exemplo é o texto História de um Olhar, no qual a metáfora dos olhos e do olhar permeia a narração da vida de Israel, um jovem portador de deficiência mental que era enjeitado numa cidade pequena até passar a frequentar a escola, cursando a segunda série do ensino fundamental. E a do Chorador, representado por um senhor que costumava ir a todos os velórios da cidade para desdenhar sua aflição e tristeza, mesmo que não conhecesse o defunto. Mostra ter solidariedade, uma vez que todos querem ter reconhecimento em vida e não apenas em morte.
As 23 histórias voltam-se para o anonimato presente nas ruas e merecedor de uma história que teria que ser relatada. Há quem encare com maus olhos os mendigos, negros, as famílias desalojadas, os que usam vestimentas rasgadas, deficientes físicos e mentais, garis, além daqueles que encontram suprimento de vida no que foi jogado fora. Os protagonistas não são famosos, mas, sim, simples cidadãos que transformam e chocam o mundo com pequenas ações revolucionárias
O livro me fez ter uma visão totalmente diferente tanto na história do Jornalismo quanto pessoal. Imaginei como cada uma dessas histórias, diria épicas, passam por nós no dia a dia e não percebemos. Estamos ocupados demais com outras histórias e atividades. A Vida que Ninguém Vê é uma obra que relata a vida que todos têm conhecimento, mas que ninguém quer admitir que existe. E acredito que é exatamente isso que a disciplina de Jornalismo de Exceção nos propõe: fazer o que ninguém está fazendo ou enxergando, ter um olhar diferente. Olhar este que vai nos destacar como profissional no mercado, o de contar histórias que, aparentemente, não tenham um grande fato para contar.

A nossa missão é, sobretudo, ouvir e perceber que podemos levar isso para o leitor. Ser, ou fazer, a exceção. Assim como no livro, temos que mostrar que todas as pessoas, por mais simples ou difícil que possa ser, é encantadora e interessante em inúmeros aspectos. O livro é uma reedição de valores e ideias que me farão ver, como ninguém, as vidas que antes apenas imaginava como seriam através dos olhos de cada um. Não à toa que o livro recebeu o prêmio de melhor livro de reportagem, do Prêmio Jabiti em 2007. 

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